sexta-feira, abril 30, 2010

Eu, Warhol, o crack e o centro

Há duas semanas fui assistir à exposição do Andy Warhol na Estação Pinacoteca, no centro de São Paulo. O local não poderia ser mais pertinente - e não estou falando do Memorial da Resistência, instalado no local onde nos anos da Ditadura funcionou o DOPS (Depto. de Ordem Política e Social, aparelho do governo que investigava, prendia, torturava e matava quem fosse contra o sistema). Falo da região do entorno mesmo.

Quem decide deixar o carro em casa e para ir até lá de metrô passa por uma das bordas do perímetro original da Cracolândia. Essa denominação "perímetro original" é minha, não li em nenhum lugar, mas creio que seja essa, sim. É o lugar onde estão rolando as obras da "Nova Luz", nome bonito usado pelo poder público para uma de nossas maiores vergonhas.

Mas vamos ao que importa. No curto trecho entre a Estação da Luz e a Estação Pinacoteca, 450m segundo o Google Maps, vi moradores de rua circulando, vagando sem rumo. Achei meio esquisito na ida. Eram 10h de um feriado, a rua estava fazia, me senti acuado ante à realidade dos fatos. Um misto de bunda-molescência (neologismo meu, ok?) e culpa burguesa, confesso.

Relaxei e fui curtir a exposição. Está ótima, cheia de quadros, instalações e informações interessantes sobre ele, sobre pop art e tudo o mais que foi dito pela grande imprensa quando do lançamento da mostra. Na saída, fiz minhas comprinhas na loja do museu, e aproveitei e almocei com a Magá por lá. Preço atraente, bom custo-benefício.

Perto das 13h, saímos de lá rumo ao metrô Luz, para voltar pra casa. Era só repetir o trajeto de 450m da volta, cruzar a estação da Luz e cair na estação. Mas tive também que me deparar com uma realidade que vejo nos jornais, apenas, e que está sempre muito distante de mim. Na volta, entendi que quem vagava pela rua eram usuários de crack, esperando os dealers aparecerem para que pudessem dar vazão ao vício.

Aparentemente, eles apareceram no ínterim que passei na exposição. Quando saí, cinco ou seis (dez?) usuários consumiam, à luz do dia e sem esconder os cachimbos, suas pedras de crack. Duas (ou dois, posto que pareciam travestis) consumiam enconstados na porta da estação.

Não, não quero dizer o quanto isso é absurdo, ou "a que ponto chegamos". O medo que eu senti indo pro museu deu lugar à tristeza, na volta. Eu e a Magá passamos no meio deles e não fomos notados. Eles estavam chapados, alheios a tudo que acontecia à sua volta.

Quando comentei isso com as pessoas, as reações variavam entre o desprezo e o deboche. Algo como "Que novidade...". É, não é novidade. Mas também não preciso achar isso legal. Na exposição, numa das frases, Warhol dizia considerar celebridades do cinema tão glamourosas e notáveis quanto autores de crimes notáveis. À Luz do que vi e ouvi, a afirmação dele faz algum sentido, não literal, é claro.

Longe de mim querer parecer uma beata interiorana espantada com a realidade da metrópole. Mas resolvi falar sobre isso por aqui. Dias depois de ter comentado o assunto com minhas tias, ouvi de uma delas: "Seu tio disse que você não precisava ter feito esse caminho. Você poderia ter cortado o trecho pelo estacionamento da Sala São Paulo".

Ok, há bolhas de segurança na região (e na cidade). Mas isso basta? Por que não, em vez de fugir por atalhos seguros, meu tio não me diga que podemos dar um passeio despretensioso pela cidade, despreocupados, sem precisar de um atalho para a segurança?

sábado, abril 24, 2010

Coincidências nem tão singelas

Passei (e passo) tanto tempo sem aparecer no blog, que a partir de agora nem vou mais justificar as ausências. Vamos adiante, então.

Ano passado, quando O Mirim experimentava um retorno à atividade (que nunca aconteceu, é verdade), eu escrevia dia ou outro. E, em algumas dessas vezes, tinha boas ideias para outros posts. Aí, escrevia uma sinopse e deixava nos rascunhos. É bom deixar alguns temas cozinhando, aí a vida dá um jeito de fazê-los reaparecer.

Hoje aconteceu de novo, com um dos temas mantidos na panela. Desta vez, as coincidências vieram bater na minha porta. Semana passada, não me lembro onde e muito menos por que, ouvi mais de uma vez a expressão memento mori. São momentos em que nos damos conta da finitude da nossa existência terrena - mesmo que isso signifique apenas uma de várias, para algumas pessoas.

Sentado ao lado do Victor Ferreira, hoje, na redação, vi o título da coluna da Eliane Brum no site da Época na tela do computador dele. O título? Memento mori, claro. (sobre a coluna da Eliane Brum, aqui a íntegra).

Bem, era hora de voltar a falar de coincidências.
Sempre acontece, como foi hoje com o memento mori.

É bom que esses temas batam à porta, me fazem pensar sobre eles. Por exemplo, fico agora imaginando se tive meus memento mori. Indo fundo, acho que a morte da minha mãe tenha sido um deles, o primeiro talvez. A morte abrupta de uma pessoa próxima (mas nem tanto quanto a mama), ano passado, acho que foi o mais recente.

O importante é incorporar isso como um aprendizado - mesmo sabendo que, ao escrever isso, eu pareço um terapeuta chato. Mas é verdade. Nesse caso, independente das coincidências, acho que lido bem com a finitude da vida. Quer pela minha história, quer pela maneira como entendo a vida.

Mas já houve coincidências importantes, que me fizeram - e fazem até hoje, quando acontecem - repensar, reinterpretar e digerir questões antigas, que às vezes deixamos largadas lá no fundo, bem longe do nosso dia a dia. Como ano passado, quando descobri como a música que estava no topo das paradas quando nasci dizia muito sobre a relação que tenho, nos últimos anos, desenvolvido com uma pessoa muito próxima e querida. Ou quando vivi o dilema ético da lágrima - talvez a mais simbólica dessas coincidências.

Acho que depois dessa pensata, definiria "coincidências" como pequenos acontecimentos cotidianos que não permitem que a gente se esqueça daquilo que não devemos - nem podemos - deixar de lado. E, em casos mais frívolos (afinal de contas, nem tudo na vida precisa ser visceral), para tornar o cotidiano menos besta e óbvio.

Hasta luego, amigos!

atualização: entrei no blog e vi que esse não era o post. Como ele era um rascunho do dia 24/4/09, é como se tivesse sido publicado naquele dia. Quando me dei conta disso? Hoje, dia 24/4/10. Um ano depois. Acho que este episódio encerra o que penso sobre as tais coincidências.