segunda-feira, novembro 15, 2010

No saguão

A causa era nobre: buscá-los no aeroporto. Acontece que menos por ansiedade do que por habilidade do motorista, a trupe encarregada de resgatá-los chegou mais cedo, coisa de hora e meia.

Daí dispuseram-se, depois dum suco de laranja (com muito gelo) e de confundirem terminal 1 com terminal 2, a inspecionar fisionomias. Havia toda uma regra: o cansaço daqueles que chegavam tinha que ser levado em conta e, do outro lado, o excesso de simpatia de quem aguardava ansioso também não poderia ser considerado.

Assim, dois deles passaram a mirar os passageiros que desembarcavam e, do lado de cá, outros dois miravam os familiares ansiosos. Como a maioria dos passageiros que chegavam eram franceses, estava difícil encontrar alguém que desembarcasse exprimindo sentimentos. Mesmo que uma bomba explodisse, a moça alta de traços firmes olharia de maneira pausada, com a cara impassível para, logo em seguida, retomar seu rumo até o ponto de táxi. Assim eram os franceses e, neste caso, isso fazia deles uma gente realmente chata de se analisar.

Os dois que analisavam os familiares - majoritariamente, mães e pais de classe média aguardando filhos, irmãos, primos e parentes de um modo geral - tinham um amplo leque de reações. A mãe que conversava com o amigo do filho enquanto o rebento não cruzava a porta. Mal considerava o que o garoto falava, tanta era a tensão do porvir. Aposto que o garoto poderia fazer uma grande revelação....

- Tia, o Pedrinho tá usando drogas!

...que ela revidaria...

- Pare de falar, garoto. Estou que não me aguento com esse menino que não sai por essa porta. Parece que nunca viu um free shop! Que coisa!

Mais um critério a ser levado em conta: o que diziam os familiares. Se fosse para elencar aqui, essas páginas não serviriam nem pros cumprimentos iniciais.

Dessa maneira passaram-se quase duas horas, num misto de análises de personas e esquetes cômicas, como o caso dos avôs sem-dedo de um ou a flatulência de origem desconhecida denunciada pelo outro. Até que...

- A mamãe chegou! (frase imediatamente seguida de barulho de sapatos correndo desesperados)

....e então, de analistas passamos todos a objetos de análise, deitados no divã, aquele frio e hermético divã que se tornara o saguão do aeroporto no fim da tarde de domingo.

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