quinta-feira, novembro 11, 2010

Obituário de um burocrata triste

Nasceu, cresceu e virou adulto dando, nas duas primeiras etapas, mais atenção ao que estava por vir na terceira. Daí trabalhou, foi promovido, sentiu-se confortável com tudo aquilo que conseguiu. Desistiu. Mudou de rumo, pura vontade de repetir o caminho desde o começo.

Trabalhou, trabalhou, não foi promovido. Demitiu-se. Trabalhou mais, trabalhou muito mais, foi promovido. Sentiu-se confortável. Muito confortável. E ali, no comando, realizou tudo o que queria. Tudo mesmo. Era como se a vida profissional completasse todos os outros campos, onde nada acontecia - ou ao menos não com a graça que ele gostaria. E viveu bem assim, por uns 30 anos.

Aí, chegou a aposentadoria, a pressão para que parasse de trabalhar. Não quis parar, nunca queria parar. Pararam com ele. Viveu sua velhice amargurado, como quem não quisesse vivê-la. Mais vinte anos. Vinte demorados, demasiados, exagerados e custosos anos. Morreu.

No obituário, dois parágrafos apenas para enumerar realizações de sua brilhante carreira. Entrou para os anais de sua área de atuação. Partiu desta cheio de predicados, embora infeliz. Foi embora resignado, achando nunca ter sido aquilo que realmente fora. Nem o que queria ter sido.

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